terça-feira, 13 de outubro de 2009

Universo oco

Deita-se e ajeita seus membros ao redor de si mesma. Puxa a cabeça mais para perto. Fecha-se. Tranca-se.

Quebra gravetos e esmigalha folhas secas com a sola de seu sapato. Nega panfletos e paga passagens com seus dedos e mãos. As orelhas suportam seu óculos. Os ouvidos abrigam o par de fones. A cabeça apoia a janela, a janela apoia a cabeça.

O sistema é fechado. Isolado. Um universo hermético.

Vira-se de costas para o sol. Caminha. Esmaga partículas de sujeira urbana. Panfletos. Anúncios. Embalagens de todos os tipos.

Evita os pombos, e, como que por instinto, também os mendigos e pedintes nas beiradas dos muros e paredes. Costura seu caminho por entre a multidão como se fosse uma linha sem fim e sem rastro.

Meios de transporte. Filas de bancos, de mercados, de lotéricas. Banheiros públicos, praças de alimentação. Cinemas, teatros. Casas de parentes, de amigos, de conhecidos. Corredores do condomínio, portas de vizinhos. Quarto, cozinha, sala, hall, banheiro. Janelas. Janelas. Janelas.

Um universo fechado. Isolado. Hermeticamente enclausurado em si mesmo, evitando infinitos universos. Contornando-os. Chocando-se contra eles. E cada vez mais trancado em si mesmo.

E ela corre. Perde o ônibus. Fila na parada. Pessoas e pessoas. Mesmo objetivo. Rumos que se cruzam por acaso. Motorista pedindo para subir mais acima para poder fechar a porta. Condução lotada.

Universo em condução. Em movimento. Mesmo assim, irremediavelmente estagnado dentro de si mesmo.

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